Um pouco a destempo tenho agora vagar de transcrever algumas saborosas passagens do embaixador Franco Nogueira, como já raro alguém escreve nesta Nação sumida:
« Entretanto, também durante o dia 12 e por todos os caminhos, afluem ao Santuário milhares, centenas de milhares de peregrinos. Descem povos das altas serras, convergem outros da planície e dos vales; comboios de autocarros e de camionetas abertas surgem das sete partidas, vindas do Alentejo e do Minho, e atravessam as estradas de acesso à Cova da Iria; pelas bermas marcham famílias e aldeias inteiras, carregando as suas crianças de colo e as condessas dos seus farnéis; por atalhos e veredas, arrastam-se velhos, trôpegos e doentes, arrimados aos seus bordões de romeiros, e de alforges pelos ombros; e de quando em quando, o tráfego afrouxa, quase se suspende, para que passem grupos de mulheres, vestidas de negro, que avançam de joelhos, com rosários entre os dedos, numa prece mais contínua, até caírem quase exânimes. É a sensação de que todo o povo está a mobilizar-se por vontade própria, e que através de mil sacrifícios acorre a um chamamento indeclinável. Grupos de estrangeiros da rosa dos ventos, alegres e numa atitude de cruzada, e muitos com as suas bandeiras nacionais, seguem os portugueses para Fátima. Patrulhas da Guarda percorrem as imediações do Santuário; não há um incidente; e as forças da ordem cingem-se a abrir caminhos, a ajudar os mais fracos e os perdidos. No despontar da aurora do dia 13 de Maio, fazem mais de um milhão e meio os peregrinos concentrados no terreiro do Santuário e cercanias.
Peregrinos, Fátima, 1927.
Mário de Novais, in Bibliotheca d'Arte da F.C.G.« […] E então, de costas para o altar erguido ao ar livre, Paulo VI contempla o mar de peregrinos: aos pés do papa comprimem-se para cima de um milhão e duzentas mil pessoas, que fazem sentir uma força feita só de Fé: e mais três ou quatro centenas de milhar espalham-se à distância, por elevações de terreno, telhados, árvores, em modo que se diria quase ocultar a própria natureza e substituí-la. Junto ao altar, ao lado direito, estão o presidente Thomaz, Oliveira Salazar, todo o governo português; e do outro lado, filas de cardeais e bispos. E perante a imagem da Virgem de Fátima, Paulo VI celebra missa. Perto, a alguns passos, encontra-se a Irmã Lúcia.
Paulo VI, Fátima, 1967.
In Porta da Loja.
« No momento próprio e em português, profere o papa a sua homilia. Que diz Paulo VI a Fátima e ao mundo? É bendito o Santuário «onde se celebra hoje o Cinquentenário das Aparições» […] Saúda os cidadãos «desta ilustre Nação que, na sua longa história, deu à Igreja homens santos e grandes»; e os peregrinos, «que viestes de perto e também de longe»; e os fiéis espalhados por todo o mundo […] Mas para o papa […] «mal seria se uma interpretação arbitrária e não autorizada do Magistério da Igreja transformasse este renascimento espiritual numa inquietação que desagregasse a sua estrutura tradicional e constitucional, que substituísse a teologia dos verdadeiros e grandes Mestres por ideologias novas e particulares que visam eliminar da norma da fé tudo aquilo em que o pensamento moderno, muitas vezes falto de luz racional, não compreende e não aceita, e que mudasse a ânsia apostólica da caridade redentora na aquiescência às formas da mentalidade profana e dos costumes mundanos».« Mas a este tempo ainda Oliveira Salazar não se pronunciara sobre a visita de Paulo VI. Esse comentário é tema do Conselho de Ministros de 23 de Maio de 1967 […] Deve ser muito confusa e complexa, julga Salazar, a razão decisiva que determinou Paulo VI a vir a Fátima e a expor-se a críticas. Críticas, além disso, também lançadas com aspereza pelos círculos afro-asiáticos e demais adversários da política de Portugal em África […]
« No plano pessoal e puramente subjectivo, qual o aspecto da visita papal que mais agradou a Salazar? Responde o chefe do governo: «a fúria dos nossos inimigos». E rindo com sabor, acrescenta: «Naturalmente, tratei o pontífice por Vossa Santidade. Sabem como me tratou o Santo Padre? Chamou-me Vossa Eternidade.»Franco Nogueira, Salazar; O Último Combate (1964-1970), Civilização, Porto, 1985, pp. 283-288 passim.
Da Nação sumida emergiram entretanto vozes institucionalonas que falam e dizem:
« Salazar, em 1967, era chefe do Governo quando, pela primeira vez, um Papa visitou o país. O ditador decretou um dia de feriado nacional a 13 de Maio e permitiu uma amnistia geral. Mas recusou encontrar-se com Paulo VI, depois de o Papa ter recebido, em Roma, representantes dos movimentos de libertação das ex-colónias portuguesas de África.»
«Só Salazar não deu tolerância de ponto», Expresso, 29/4/2017. (Para uma verdadeira dimensão da asneira do Expresso saco de plástico, confira o benévolo leitor Helena Matos, «A salazarologia», in Blasfémias, 29/4/2017 e José, «O jornalismo do Expresso recende a madrassa antifassista», in Porta da Loja, 30/4/2017).
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