Há um rapaz de cabelo curto bem aparado à volta das orelhas, sem melenas nem madeixas, que fala na televisão fazendo-se passar pelo Nuno Rogeiro.
Ora! Toda a gente conhece o Nuno Rogeiro.
(Imagem do motor de busca)
Hoje houve arrastão na praia.
Hoje há conquilhas, Algarve, 2007.
Ontem à noite, a máquina de selos dos correios dos Olhos de Água deu-lhe a telha. Pus-lhe € 0,30 troca-
dos. Não me deu o selo. Saiu o recibo mas o selo não. Ora para mim o pago, pago está. O postal foi sem estampilha para dentro do marco. Vamos ver o que acontece…
Faltam-me duas folhas para encher este caderninho e acabei de comprar um igual, mas desses novos com capa mole, que era só o que havia. Já me arrependi. O tom de grande novidade - a capa mole – no rótulo é o que se sabe. Se fosse coisa boa – e o clássico de capa rija já existe há tantos anos – não a tinham já inventado há muito?!...
Ainda a propósito das esculturas de areia (este ano são sobre Hollywood). A tia Antónia lembrava-se que a filha dos Flinstones se chamava Pedrinhas, imagine-se.
Diz o noticiário que o gelo da Patagónia se fractura agora, em pleno Inverno austral. A água na praia tem estado fria, pois... Deve ser disso.
Ouço na televisão loas ao Paulo Rangel, o novo líder do grupo do P.S.D. na Assembleia, em véspera do debate do estado da nação. No Expresso de 28/6 uma reportagem com um título muito em voga, “O menino de ouro do P.S.D.", qualificou-o “inteligente, bizarro, brilhante, ambicioso” (bizarria no meio das melhores qualidades compõe muito bem hoje em dia porque é marca de rebeldia, ou fracturante, como é agora elegante também dizer-se).
Há dias andou o dr. Dias Loureiro com outro menino de ouro ao colo – certamente penhorado (o dr. Dias Loureiro) a alguém ou a algum negócio (que tem muitos), pois que me pareceu ouvir que não conhecia o sr. engº Sócrates por aí além.
O paradigma do regime é o duma confraria de elogios. Com uma colossal secretaria de propaganda nacional.
Amanhã não sabemos.
Já não há o hábito de escrever postais nas férias, agora com a rede da Internete e o correio electrónico... Nas férias não uso computador, evito-o. E muitas vezes recupero o velho hábito de enviar postais. Hoje comprei um para mandar a não sei quem. Que hei-de escrever? Que nós cá bem, obrigado, e vós aí todos com saúde, esperamos? Que quando chegámos o tempo estava quente e a praia esplêndida, mas que de terça para cá se levantou vento e o calor abrandou? Que descreio do aquecimento global que impingem por aí nos noticiários, pois que desde há uns anos noto o Verão assim, meio frescote, e o caldinho da água no Algarve já não é o que era, enfim?!...
Ontem, sábado, passámos a tarde com os tios; almoçámos uma sardinhada e jantámos umas gambas que eles ofereceram. Agora vamos todos a Pêra ver as esculturas de areia. Ao depois contamos jantar no ..., o rei dos frangos, na Guia, que calha em caminho. Nesta vez pago eu.
Meia hora é quanto o empregado nos diz que leva a haver mesa.
Não sei se o franguinho no ..., o rei dos frangos é melhor que no do costume. O meu paladar para galináceos da Guia não distingue esses detalhes. Todos me sabem bem, especialmente com fome. O que sei é que o ..., o rei dos frangos tira a freguesia toda às outras casas de pasto daquela freguesia. Enquanto espero comparo a imagem dum aviário com todos aqueles frangainhos sempre de roda da farinha na engorda industrial, com as carradas de bípedes sem penas que se apinham gulosos no ..., o rei dos frangos. Duas espécies de bípedes e duas espécies de aviário.
Há sempre gente caminhando na praia; uns para cá outros para lá. Alguns deles ao depois voltam, como o vendedor das bolas de Berlim a quem comprámos duas há bocado. Ele bem olha a ver se queremos mais. Não era má ideia mas melhor é estar quieto. Daqui nada é hora de almoço.
Uma horda de germânicos chegou agora e assenta arraial aqui ao lado. Começam a montar uns paus de tenda. Outro bando de nórdicos que chega abanca mais para lá, sem tendas; um enche um colchão a sopro; os outros nem tiram a roupa. É quase uma da tarde; dá-me ideia que estes bárbaros seguem o hábito de vir para a praia mal acordam. Aproveitam a praia para acabar de dormir. E aproveitam a noite para se deitarem tarde, aposto.
O vento sopra inconstante. Pior quando chegámos de manhãzinha. O calor aumenta agora um tanto mas à sombra, debaixo do chapéu, faz fresco. A senhora queixa-se.
Os veraneantes continuam a ir e vir. Há pouco passaram dois velhotes de camisa, conversando: um mais forte; outro mais magro. O mais forte fazia lembrar o tio Júlio com aquele panamá na cabeça. Talvez falassem da bola. Cuido que os já vi no ano passado, mas então eram três.
Subo os olhos da linha do horizonte e vejo nuvens distantes. A atmosfera está límpida, porém. Entre o cabo de Santa Maria e a ponta do Castelo mar calmo; hoje não há sinal de ondas gigantes. Há pouca ondulação mas a água está gelada que se farta.
- Quantas folhas te sobram no bloco?
- Quatro - respondo.
- Óptimo! Fecha isso e vamos embora.
Rua dos Bacalhoeiros, Lisboa, [s.d.].
Eduardo Portugal, in Arquivo Fotográfico da C.M.L..
Epá! O Saramago não merecia isto.
Nem a Rua dos Bacalhoeiros...
Casa dos Bicos, Rua dos Bacalhoeiros, 50 [i.e., 10], [s.d.].
Arquivo Fotográfico da C.M.L..
Ontem já o temia. A brisa que se pôs deu numa ventania tal que nos soprou da praia. A premonição confirmou-se, infelizmente... Como era bom que amainasse.
Praia da Falésia, Algarve, 2007.
Fomos à Guia. Ao costume, como de costume. Tanto me dá jantar neste como naquele, desde que não espere muito... Por isso - e porque sempre é mais rápido não gastar tempo a escolher outro - fomos ao do costume...
A caminho da Guia noto a massa de casario, baixo, mas que se estende na paisagem a partir do cruzamento de Ferreiras; é uma larga malha de construção incaracterística sobre a paisagem. Já nem nos pastiches pegam...
Aproximando-me da Guia, abaixo do centro comercial - este sim, um verdadeiro pastiche arquitectónico mexicano - a mesma coisa: a malha de betão adensa-se e espalha-se sobre o terreno como uma praga endémica. Todo o litoral sofre dela. Cuido que povoações castiças, pequenas, que acabavam logo ali numas terras de alfarroba depois duns armazéns talvez só na serra. Ou em Marrocos...
Pastiche mourisco, Algarve, 2007.
Após o jantar passámos no centro comercial. Comprámos uma série de filmes do Poirot e metemos os serões de excelência dos canais públicos no contentor.
A escola primária de Vale Verde na Guia exibe uns dizeres: Associação de Apoio à Pessoa Excepcional do Algarve. Sem beliscar um milímetro que seja a benemerência da instituição nem a filantropia dos associados, não consigo distinguir se o eufemismo politicamente correcto no nome é obra duma pessoa excepcional ou duma pessoa excepcional.
Escola primária de Vale Verde, Guia, 2006.
Imagem do Poirot em www.saltygoodness.com
Uma prova que os ciganos são gente perfeitamente aculturada nos valores democráticos de Abril - cidadãos comuns, portanto - é a manifestação nacional que pretendem convocar.
Outra prova é o negócio de troca directa de votos por habitaçã' sociáli que têm feito com inúmeros edis.
À sombra. Na calmaria da hora da sesta o tempo dilui-se, sem conversa, sem ruídos humanos ao redor, sem televisão ou rádio marcando ritmos diários ou de qualquer espécie. Uma rola arrulha insistente, namoradeira talvez; atravessa o chilreio constante da passarada mais miúda. Aqui ou acolá soa um gaio. É o que se ouve, mais do que se vê.
Após longos minutos de inacção pego num livro. A senhora pergunta-me o que leio...
- Vários vapores fazem a viagem dos portos do Algarve, depois de terem tocado em Sines e Vila Nova de Milfontes. Realiza-se pelo menos uma carreira mensal (informar-se na Empresa Nacional de Navegação). Fazendo escala por Lagos, Portimão e Faro, chegam até Vila Real de Santo António, de onde seguem Guadiana acima, uns até Pomarão, outros até Mértola.
- Nunca mais cá chegávamos.
- O Guia é 27; quando a vida talvez tivesse o ritmo certo. Hoje há o sobressalto da produtividade que supera tudo.
- Daí a excelência...
E em complemento da resposta ajeita-se na cadeira dando moleza às pálpebras.
Eu por mim absorvo-me mais no tempo...
« De Lisboa a Beja pelo caminho de ferro de Sul e Sueste; de Beja a Mértola e Mina de S. Domingos por estrada; da Mina a Pomarão pelo caminho de ferro privativo da companhia. Também se pode fazer a excursão fluvial a partir de Mértola. - São frequentes os vapores que descem o Guadiana e raros os dias em que se não efectua alguma carreira.
De Pomarão para baixo (1) o Guadiana [...] corre esverdeado entre montes abruptos e severos, que à medida que o barco navega vão surgindo sempre uns atrás dos outros - à esquerda a Espanha, à direita Portugal -, os nossos mais pacíficos e às vezes cultivados até ao rio, os dos vizinhos austeros, pedregosos e bravios - grande uniformidade deserta onde aparece, isolada e perdida no cenário, uma ou outra casinha colmada. Diante de nós, a água que anima tudo isto, lisa e unida à proa do vapor, com veios longínquos mais quietos e riscos que estremecem à superfície; e naquela braveza de fragas e vegetação quase negra das encostas, irrompe de quando em quando uma amendoeira, que se entreabre no Inverno em milhares de pequeninas flores, como se toda ela criasse asas. Para longe avistam-se mais serras, serras desta Espanha que daqui se nos afigura esfarrapada e concentrada. E o barco segue, e os montes seguem-nos, encerrando o rio numa série de lagos dormentes, cheios dum encanto melancólico e selvático. Às vezes afigura-se-nos que vamos tocar naquela tremenda barreira lá no fundo, mas o vapor dá uma volta à procura do canal, e entramos noutro lago de encostas cortadas quase a pique sobre as águas. Outra volta, outro lago, este mais amplo, luminoso e azul, cujas margens se entreabrem para nos desvendar um cantinho cultivado e rústico - uma casa, algumas árvores e três palmos de erva muito verde. Desce-se, e o desfile, um pouco severo mas amplo, variado e cheio de luz, vai-se renovando sempre diante dos nossos olhos. É um cone formidável que se destaca dos outros montes; é Alcoutim num fundo risonho de Amendoeiras, com S. Lucar do Guadiana na margem oposta; é sobretudo a vida maravilhosa das águas, que se embebe de todos os tons do azul e dos montes, e que estremece, reluz e modifica a todos os momentos, com uma sensibilidade extraordinária. Os montes agora transformam-se em colinas verdes. Repetem-se com mais frequência as terras cultivadas na nossa margem e às vezes na da Espanha. Quando o monte não acaba a pique, vêem-se sempre na faixa à beira da água alguns pés de oliveira, a negra alfarrobeira e a vinha baixa que se estende até à água. Estamos no Torno da Pinta, que é um dos mais lindos cotovelos do Guadiana. De aqui em diante as curvas do rio são menos acentuadas e começam a distinguir-se os bronzes imóveis da serra de Alcoutim. As povoações surgem muito próximas, Álamos, Laranjeiras, Guerreiros, sempre na nossa margem - e o rio ganha uma amplidão luminosa. O céu esbranquiçou, perdendo e esmalte do Alentejo. O calor aperta mais. Outra povoação, a Foz, na confluência da ribeira de Odeleite, e quase logo na nossa frente uma grande superfície líquida entre terras que foram sucessivamente baixando, dum lado solitárias e envoltas em farrapos, do outro mais humanas e mais ternas. Sente-se já no rosto a viração do mar. Todo o rio estremece em escamas de luz até os grandes plainos verdes e indecisos. À esq. começa a ofuscar-nos a brancura voluptuosa de Ayamonte, tendo à mão direita a interessante vila de Castro Marim, apertada entre dois morros e com o seu castelo enegrecido. Mas já Vila Real tremeluz e aparece na linha baixa e confusa, mergulhada na água, perdida e afogada em sol.»
____
(1) Por Raul Brandão.
[A margem espanhola era mais erma que a portuguesa. Pequenos nadas em que raramente pensam os que sabem que a independência de Portugal só pode ser trabalho do acaso. Por isso é vê-los esvaziar a raia.]
Notas:
Excertos de itinerários para o Algarve em Raul Proença, Guia de Portugal, vol. II, Estremadura, Alentejo, Algarve, texto integral que reproduz a 1ª ed. publicada pela B.N.L. em 1927, F.C.G., Lisboa, imp. 1991, pp. 212-214.
Óleo Na Sombra (1900-1910), de Aurelia de Souza, Bragança, Museu do Abade de Baçal.
O bilhete postal de Mértola - vista geral e castello foi circulado de Lisboa, Portugal, para Fontenay, França, em Agosto de 1905. Ed. de F. A. Martins, Camões, 35 – Lisboa. © Blog da Rua Nove.
A minha mãe era fã dos filmes americanos do tempo do Fred Astaire, da Rita Hayworth e por aí fora. Quando os filmes acabavam aparecia sempre aquela legenda The End. Então ela dizia com certa pena: - Tem Éden. Acabou.
Eu também me dá pena ver as coisas boas acabarem.
Rita Hayworth - Put The Blame On Mame
(Gilda, 1946).
Todos os anos há caras que se repetem na praia. E escritos que se repetem no caderninho. No ano passado tomei nota disto; podia chamar aos repetidos da praia os cromos para a troca...
Hoje o homem que devorava livros estava só a ler o jornal.
O homem que devorava livros, Algarve, 2007.
Nas sociedades industriais não manda o mercado. Nem manda a procura. Manda a oferta. E assim o mercado tem tudo o que eu possa procurar. Desde que eu procure o que o mercado oferece. O que o mercado oferece. Se, no mesmo cânone, eu procurar o que o mercado ofereceu posso bem ficar tramado. A oferta é como um surfista cavalgando a onda; tem de ser a última; ele pode lá cavalgar-se a onda anterior que foi descontinuada na praia...
Eu só queria um caderninho clássico de capa preta: com capa rija. E o mercado dizendo-me só: - "Agora com nova capa mole!"
Resisto.
Por uma questão de partilhas antigas veio à baila o meu bisavô Joaquim Bernardo, pai da minha avó materna. A tia Mariana diz que o conheciam por Jaquim Sereno. Pois agora recorda-me: a mãe também falava dum avô Sereno...
A Espanha lá foi campeã mas a única festa que se ouve lá fora são os grilos. E uma cigarra, também, parece...
Ele há vantagens sem preço em estar na província.
Ilustr.: Maria Keil, Luís Filipe de Abreu, no Livro de Leitura da Segunda Classe.
Desço a rua e vejo uma montanha de terra ao fundo em lugar do pinhal. E gruas. E betoneiras. Na praia é que haviam de construir: há areia e água com fartura; bastava só levar o cimento. Sempre se poupava o pinhal.
Tornei ao ritual do jornal na praia. Comprei o Expresso (o Sol ainda não havia, era cedo). E resolveu-se-me o dilema de qual dos dois comprar.
- São dois cafés, por favor. Pode ser, Ti Pedro?!...
- Pode sim. Separados?
- Sim senhor! Em chávenas diferentes.
- Ora aqui tem: dois cafés bem fresquinhos, acabadinhes de tirar.
O Ti Pedro é o senhor da geladaria. Diz sempre bom dia num tom cantado, mesmo que seja boa tarde. Com ele consegue-se diálogos um tudo nada desconcertantes.
O areal da praia este ano parece-me maior. Noutras eras só o mar seria arquitecto para tamanha obra. Hoje sei que podem ser as câmaras municipais…
O Expresso pesa tanto como há dois anos (eis há quanto o não comprava). Contém:
Ah! E um saco de plástico.
Conhece a manha – “Enriqueça! Envie-me € 100,00 e dir-lhe-ei como…”?
O saco de plástico instrói “como poupar seis mil euros”. Mas só a quem lhes pague € 19,90 pelo compêndio dos descontos. Podiam ter-lhe juntado O Segredo com uma promoção pague 1 tome 2… banhos.
Tomei antes dos a sério.
A lista telefónica é da periférica.org; o rol refere-se ao saco de plástico de 28 de Junho de 2008.
Adamastor (O)
Apartado 53
Bic Cristal
Blog[o] de Cheiros
Carmo e a Trindade (O)
Chove
Cidade Surpreendente (A)
Corta-Fitas(pub)
Delito de Opinião
Dragoscópio
Eléctricos
Espectador Portuguez (O)
Estado Sentido
Eternas Saudades do Futuro
Fadocravo
Firefox contra o Acordo Ortográfico
Fugas do meu tinteiro
H Gasolim Ultramarino
Ilustração Portuguesa
Lisboa
Lisboa de Antigamente (pub)
Lisboa Desaparecida
Menina Marota
Meu Bazar de Ideias
Paixão por Lisboa
Pena e Espada(pub)
Perspectivas(pub)
Pombalinho
Porta da Loja
Porto e não só (Do)
Portugal em Postais Antigos(pub)
Retalhos de Bem-Fica
Restos de Colecção
Rio das Maçãs(pub)
Ruas de Lisboa com Alguma História
Ruinarte(pub)
Santa Nostalgia
Terra das Vacas (Na)
Tradicionalista (O)
Ultramar
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.