Dizia-me há tempo uma mocinha de liceu:
- Tenho uma colega brasileira que diz que agora, com o Acordo Ortográfico, aquelas palavras brasileiras vão tornar a ser portuguesas.
- Errado, menina - respondi-lhe. - O Português é que se vai tornar brasileiro.
Há gente que tem o privilégio de escrever em jornais de grande tiragem e parece intocável. Por muito pouco sagaz que demonstre ser.
Um certo Raposo investe desembestado contra a A.D.S.E. ("Os privilegiados da A.D.S.E.", Expresso.pt, 23/7/2010) e o primeiro mal que lhe acha é que vem do tempo do dr. Salazar. — Bom! O Portugalinho metropolitano de Abril vem inteirinho do tempo do Estado Novo… — Mas não se ponha ele em tantos cuidados que isso tira-lhe a saúde… Descanse. Portugal está pouco menos que extinto, não há pesada herança do fachismo que muito mais reste.
Quanto aos privilegiados que lhe motivam a codícia nos dois restantes e confusos parágrafos do pobre texto, visse ele o número deles antes e depois de 74 num quadrinho facilmente achado na Internete, e intuísse ao menos o tempo e o modo em que a «aristocracia sindical» — como muito bem diz — se constituiu, talvez então investisse mais certeiro ao forcado que às tábuas.
Fonte de Dados: D.G.A.E.P./M.F.A.P. Inquérito aos Recursos Humanos da Função Pública (1979; 1983; 1986); 1º e 2º Recenseamentos Gerais da Função Pública (1996 e 1999).
Fonte: PORDATA (última actualização: 2/3/2010).
Este sr. Raposo parece-me um bom produto colhido de raiz no terrunho português revolvido em 74: é vago, não sabe estudar, não faz o mínimo de trabalhos de casa, chegou tarde aos exames e provavelmente também não vai a tempo de chumbar. E instrui-se muito de ouvido pelos foles da propaganda vigente. Eu estaria como ele se não trabalhasse por aprender melhor. Serei privilegiado se o conseguir.
Campolide, Lisboa, 1980.
Título original:Ancient transport, in Wood's Library.
O ex-ministro do ambiente do consulado de Guterres convocou hoje uma conferência de imprensa para dizer solenemente à nação qualquer coisa com que se animou...
Pólo de animação ambiental, Alcochete, 2008.
Na Frineve do Areeiro custava 425$00. Fui desencantá-lo por 395$00 já não sei onde. Tinha eu um gira-discos com uma agulha que parecia um prego. Risquei-o na faixa da Bette Davis Eyes logo na primeira ou segunda vez que o pus. As gémeas pediram-mo emprestado. Tiveram-no uma semana e quando mo devolveram os riscos tinham desaparecido. A capa parecia mais nova e tinha uma etiquetazinha da Frineve na contra-capa com o preço escrito a caneta: 425$00. Não sei o que se terá passado. Não sei se o riscaram elas mais ou se cuidaram ter sido elas a fazer os riscos que já tinha. Compraram-me um disco novo.
Jackpot. Os Superêxitos 81, Valentim de Carvalho.
(In miau.pt)
No começo [ou meados] de Junho de 81 - estaríamos para acabar as aulas - lembro-me que houve uma sucessão de dias acima dos 40º. Num ou dois parece-me que chegou aos 43º. Desde essa altura que me não lembrava de o chuveiro me deitar água quente pela torneira da água fria. Hoje isso sucedeu-me.
Associado a esses dias do começo de Junho de 81 vem-me sempre à memória também aquela cantiga do Chico Anísio (*). Ouvia-a amiúde nos discos pedidos enquanto procurava alguma aragem fresca pela tardinha, à janela (e ao mesmo tempo que ia também catrapiscando as gémeas lá na janela delas).
Kim Carnes, Bette Davis Eyes
(1981)
(*) She'll unease you, no 2º verso da 2ª estrofe da cantiga.
Texto revisto à 8h09 da tarde.
Não vou tão atrás quanto o Stewart e o Cévert ainda andarem nas corridas da Fórmula 1, mas recorda-me daqueles domingos domésticos que a Luísa conta. Recorda-me até de (é daqueles episódios de nada que por qualquer razão se nos gravam na memória e nunca mais esquecemos) certa vez, depois dum desses domingos de corridas certamente, no recreio do 1.º ou 2.º ano do ciclo andar eu sozinho a cogitar com os meus botões pouco mais duma dúzia de nomes de pilotos que o eco do locutor Adriano Cerqueira me deixara no ouvido: Niki Lauda, Mário Andretti, Ronnie Peterson, Carlos Reutemann, Clay Regazonni, Gilles Villeneuve, Patrick Depailler, Vittorio Brambilla, Jacques Laffite, Jody Sheckter, Jochen Mass, John Watson e, claro, o Fittipaldi. — A um brasileiro ouvi certa vez dizer que o Fittipaldi, desde que trocara a McLaren pelo Copersucar, cortava a meta sempre depois do último.
Mas aficionado certo, seguindo fielmente os treinos e as corridas, foi só no Verão de 81, o melhor campeonato que me lembra.
Meia dúzia de anos depois a Fórmula 1 perdeu todo o interesse, quando as corridas passaram a ser um contra-relógio de mecânicos mudando pneus nas boxes e o primeiro era sempre o invariável Schumacher.
E já agora a propósito de locutores, creio que foi por essa altura que a R.T.P. lançou na Fórmula 1 aquele que é hoje apresentador do TV Turbo. Na primeira vez que o mandaram às corridas saiu-se tão bem que o jornal Auto-Sport publicou uma caricatura com o Alain Prost e o McLaren n.º 1 num poster na parede, em que se via perguntar a um candidato a locutor:
— Conhece este piloto? — e apontavam o Prost.
— Não...
— Conhece este carro? — e apontavam o McLaren.
— Também não.
— Muito bem! Está contratado para locutor da Fórmula 1.
E claro que Monte Carlo é sempre fascinante.
Grande Prémio do Mónaco, 1972
Por € 3,50 compra-se no Pingo Doce um livrinho que diz o óbvio. Pode parecer que não mas faz muita falta dizer o óbvio (embora canse a quantidade de vezes que vai de repeti-lo), dada a quantidade de mentecaptos incapazes de perceber que a neve é branca e que se não torna cor-de-rosa por decreto...
Valorizando certamente um dado perfil, surgiu o «Curso de Jogador(a) de Futebol», com equivalência ao 9º ano, promovido pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional/Centro de Emprego e Formação Porfissional da Guarda, e iniciado em 2007. De acordo com o folheto, este curso destina-se a jovens entre os 15 e os 25 anos, com 6.º ou 7.º anos de escolaridade, e uma das actividades principais privilegia o saber «Utilizar a imagem pública na construção da carreira e do êxito pessoal, na divulgação da equipa e do clube que representa», alimentando a ilusão de um dia igualarem um dos muitos milionários do futebol, nacionais ou estrangeiros. Nada do que é exposto tem como objectivo a diminuição iliteracia ou o investimento na formação cultural dos candidatos, parecendo tudo resumir-se a «encontros de futebol, execução de exercícios físicos e tácticos, ou treinos de conjunto». Como é possível atribuir a este curso a equivalência ao 9.º ano, se, na realidade não se equivalem?
A resposta, desgraçadamente, é ainda mais óbvia:
Vivemos, sem dúvida, em matéria de Educação e Instrução, no reino do Absurdo, deixando-nos manipular e seduzir por facilidades e contínuas ilusões que nos despojam das nossas próprias capacidades. Assistimos a um discurso do simulacro, que atinge a nossa dignidade humana, consentindo-o irresponsavelmente.
Maria do Carmo Vieira, O Ensino do Português, Fundação Francisco Manuel dos Santos/Relógio d'Água, 2010, p. 97.
(Gravura: Na Escola, Eileen Soper, 1922.)
« Durante a noite tudo esteve sossegado em Lisboa; na verdade nem todos sabiam que os ministros e a tropa tinham evacuado a capital. Fizeram contudo apenar durante a noite carros de toda a qualidade para lhes conduzirem as bagagense as famílias [...]
Os ministros de D. Miguel haviam forçosamente de saber pelo telégrafo que eu me achava próximo, e eles também sabiam que quase sempre reina no Tejo um vento fresco durante o dia; atrevo-me a dizer que eles tinham uma inquieta suspeita de que eu forçaria o rio, o que sem dúvida tinha efeito nos seus temores, porém isto nada diminui os louros do duque [da Terceira]. Se o governador de Almada tivesse permanecido firme no seu posto, e os ministros nos seus, é mais que provável que o duque ficaria perdido. Molelos estava próximo; podia ter sido reforçado de Lisboa. S. Julião, o Bugio, e as numerosas baterias no Tejo estavam em boa ordem, e bem guarnecidas; o duque teria sido rodeado de inimigos, e por causa do pouco vento, eu não teria penetrado no Tejo antes do dia 27. Se ele se sustentasse, e eu conseguisse aproximar-me da cidade, o que deveria ser acompanhado de grande perda, poderia então atravessar as suas tropas para Lisboa, e provavelmente o inimigo seria aniquilado; porém, se eu falhasse na empresa, não havia retirada, e ver-me-ia obrigado a deitar fogo à esquadra, e reunir-me ao duque com os marinheiros, e soldados da marinha, e então só Deus sabe como terminaria a guerra. Contudo, do modo que aconteceu foi muito melhor; e no seguimento da obra mostrarei que os ministros de D. Pedro eram tão capazes de dormir a sesta como os de D. Miguel; e que se isso dependesse deles ter-se-ia perdido Lisboa com a mesma facilidade com que se ganhou.
O duque do Cadaval achava-se ainda nas vizinhanças da cidade, e eu tinha consideráveis receios de que, tendo-
-se certificado da pequenez da nossa força, ele voltasse atrás, e convertesse a nossa alegria em dor e em luto. Em ponto de facto, se ele tivesse mostrado o mais pequeno grau de decisão, teria chamado a divisão de Molelos, e, ou nos teria repelido de Lisboa, ou nos bloquearia no Castelo de S. Jorge, em menos de quarenta e oito horas; pois, ainda que havia grande entusiasmo entre o povo, este não tinha a mais distante ideia de ser atacado. E em lugar de as autoridades mandarem imediatamente obstruir e entrincheirar as ruas, e fazer cortaduras em todas as direcções, não se cuidou em nada mais que comer, e beber, e regozijar-se.»
Charles Napier, A Guerra de Sucessão entre D. Pedro e D. Miguel, Caleidoscópio/Centro de História da Universidade de Lisboa, 2005, pp. 120-122.
Moral da história: 24 de Julho, de sempre, é mais copos que outra coisa.
Há exactamente cinco anos publiquei um verbete "sem prédios" - uma ironiazinha sobre modos de edificar uma cidade, a propósito do assunto que devia ser candente na altura, a construção do novo aeroporto de Lisboa. - Pois bem, o que quero dizer não é sobre isso; é sobre a fotografia com que o ilustrei, cuja legenda tresladei do Arquivo Fotográfico da C.M.L. e cuja autoria é atribuída a Armando Serôdio com data de 1966. O autor até pode estar bem, caso tenha trabalhado no estúdio de Horácio de Novais na primeira metade dos anos 50, mas o ano está errado.
Dei-me conta que publiquei a mesma chapa em Maio passado numa prosápia balofa sobre os primórdios da Alameda, desta vez colhendo a imagem doutra fonte (Biblioteca de Arte da F.C.G.) com muito melhor qualidade. O que mostra deixa circunstanciar a data da fotografia pela primeira metade dos anos 50 (cf. Dois prédios na Alameda). E obriga-me a 'corrigir o tiro' no verbete de há cinco anos.
(Ficha do catálogo do A.F.C.M.L.)
Em 2002 rumámos à terra do Chanquete, em férias. O pacote incluía uma semana de alojamento a meio quilómetro da praia; refeições e estender as toalhas no cascalho era por nossa conta. Ora deslocações de 500 metros de ida e volta a pé para a praia, de manhã e de tarde, mais estender as toalhas, haveis de imaginar, são uma grande canseira!... Por isso não admira que de súbito começasse a ouvir à senhora:
- Esta vida de turista!...
Um suspiro que se tornou puma piada nossa e muito calhado para título dalgumas crónicas de praia que às vezes escrevo. Estas são de...
Manhã de sábado. Os noticiários só dão secutes (auto-estradas s/ cuts para o utilizador). A 'investigadora' Felisbela comenta na TV o assunto. Ouço-lhe no meio da conversa que "muita a gente usa as secutes: para ir trabalhar, ou indo de férias, e mesmo quem está no desemprego..." (?!) Vou a pé para a praia.
Acabei com isso. Põem-lhe letras a menos e ainda assim pesa mais que um garrafão de cinco litros.
Devo ter tomado o banho de mar mais longo numa data de anos. Água ainda melhor que no sábado passado. Céu limpo. Visibilidade do cabo de Santa Maria à ponta do Castelo. Há muita gente na praia mas não identifico caras daquelas que sempre reconhecemos de ano para ano. Devem achar-se perdidas na multidão. Ou metidas em baixo, à conquilha.
À conquilha, Algarve - (c) 2009
Esquecia-me de dizer: não há vento.
Está calor e deixamos a praia. Uma mulher à minha frente tem o nome tatuado nas costas, logo abaixo do pescoço. Chama-se Manuel.
Do fundo duma televisão ali ligada ecoou há pedaço o sr. ministro da presidência dizendo (por outras palavras) a bizantinice que é querer agora rever a Constituição.
É pois! Tal como o foi a vil revisão semântica do instituto do casamento.
Mas sobre Constituições vale mais o que disse o prof. Hermano Saraiva: a melhor Constituição não torna bom um mau governante, nem uma má Constituição impede um bom governante de governar bem.
A Choldra. Semanário republicano..., nº 10, 3/4/1926.
In Hemeroteca Digital.
Li no Sol (2 de Julho) um descarado anúncio requentado: "Edifícios do século XIX reconstruídos em Belém" (Casa.Sapo.pt, 22/6/2010).
Estiveram estas casas ao abandono e à beira da derrocada. O IPPAR, ronceiro, fazia que classificava desde 1991. Queriam os donos lá um hotel — dito de charme, com charmoso incremento na volumetria. O plano director não deixava. A Câmara coagia a obras... E então arderam estas casas espontaneamente (O Carmo e a Trindade, 4/12/2006).
Edifícios do século XIX reconstruídos em Belém. — Dito assim nem parece venda de andares.
Casa onde morou Almeida Garrett em 1852, Pedrouços, 1940.
Eduardo Portugal, in Arquivo Fotográfico da C.M.L..
Adamastor (O)
Apartado 53
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