...
Estava aqui meio para ver o que me saía do título para dizer sob o palacete e diz-me a senhora: -- «Palacete couve? E palacete alface, não há?»
Calhou bem o trocadilho, que assim já me sai escrita alguma coisa sobre esta casa da Avenida Ressano Garcia, na esquina com a Visconde de Valmor. Ficava onde é hoje o 45 da Av. da República. O palacete a seguir (à direita), mais modesto, temos a ventura de o ter lá. -- Mais um milagre!...
Bom, e no meio disto acabei por dizer à senhora o óbvio; palacete alface não sei; não conheço. Há, sim, pátios e Pateo alfacinha. Mas não era deles que ia tratar. É do que se opunha diametralmente ao clube de empresários, na esquina da Visconde de Valmor com a Ressano Garcia...
Fazia lembrar uma escola primária.
[Av. Ressano Garcia] Av. da República, 45, Lisboa, c. 1905.
Paulo Guedes, in Arquivo Fotográfico da C.M.L..
« O snr. Manoel Pires, pharmaceutico approvado por outro pharmaceutico que não foi approvado em parte nenhuma, estabeleceu a sua botica n'uma aldêa do concelho de Carrazedo de Monte Negro. O seu laboratorio chimico era um fogareiro e uma retorta de vidro, emendada no collo por um cylindro de lata. A sua livraria era o Medico lusitano, in folio; uma Pharmacopeia, edição de 1700; e um pequeno volume intitulado ― Segredos da natureza. Os lotes, que eram seis, continham garrafões de barro vidrado, atapulhados de hervas, que tinham o merecimento chronologico de serem contemporaneas dos garrafões. Afóra isto, não sei que liquidos verdes e amarellos e azues variegavam um dos lotes, que, pelos modos, continha os remedios heroicos, como oleo de amendoas dôces, extracto d'amoras, solimão, e oleo de mamona.»
Camillo Castello Branco, «Aventuras d'um boticario d'aldêa», in Scenas Contemporaneas, 2.ª ed., Porto, Cruz Coutinho, 1862, p. 43.
A «diretora» desta nem com óleo de mamona lá vai.
Pharmacia com f... de fraquinha, Lisboa, 2012.
Em Portugal devemos ser muito ricos. Muito ricos ou loucos. Só gente muito rica ou demente pode ser perdulária assim... — Veja o benévolo leitor! Veja as soberbas mísulas que suportam as varandas das casas geminadas. — Sabe o que lá fizeram?
Av. da República, 25-33, Lisboa, post 1908.
Paulo Guedes, in Arquivo Fotográfico da C.M.L..
Por um qualquer milagre este casarão (moradia, segundo o arquivista) está de pé. Está à venda há um par de anos. Como foi classificado e não se pode demolir ninguém o compra.
Pode o benévolo leitor vê-lo na Av. da República ante o Campo Pequeno. Mas para deliciar-se com os horizontes daquele lugar -- o forte do Monsanto dum lado e o arvoredo da Azinhaga das Freiras (Rua da Beneficência) lá para os altos da Torrinha -- prima a imagem se faz favor.
Av. Ressano Garcia, 77, Lisboa, 1907.
Paulo Guedes, in Arquivo Fotográfico da C.M.L..
Hoje falaram-me numa (apareceu-me diante, escrito) colega concetora e formadora...
Os espanhóis têm a Inmaculada Concepción. Não sei se para os portugueses há alguma Nossa Senhora da Concepção. Nossa Senhora da Conceição há há muito; é padroeira do reino de Portugal (que já acabou) e é do tempo em que o bom povo português ditongava de seu natural em -ei-, -eu-, -oi-, -ou- e -ui- os grupos -pt- e -ct- latinos. Daí ter o génio da língua (o bom povo desses tempos) concebido «conceição» (< conceptionem) e gerado fruito (< fructum). Desde, porém, que a instrução passou formação (uma espécie de moldagem) Nossa Senhora deixou de guiar o bom povo e passaram a ser os governos. Governos de doutos (< docti) letrados que alatinaram o idioma tornando cá prenhes da concepção e dos fructos. E, finalmente, governos de analphabetos licenciados que são gênios concetores. Seus fruto é qui são azedo.
Um artigo de 17 de Julho no Jornal de Oleiros — «Acordo Ortografico? Não, obrigado» —, pelo advogado dr. António Moreira, provocou uns perdigotos dum João acordita que cuspiu, «a verdadeira base da aversão ao A.O. [de] 90 em Portugal» é o «ódio latente antibrasileiro». — Formidável! — E logo ali, como português contrito de o ser, bolça que a reforma de 1911 é que feriu os brasileirinhos durante décadas, tadinhos; a eles, pobres ostracizados, mai-la sua ortoépia (ele diz prolixamente «traços de fonética e de sintaxe levados pelos 'valentes marinheiros' e 'heróis do mar'») de antigo e genuíno sabor português. Como contraponto, a nós portugueses (quais insectos), borrifa-nos de cacofonia (ele chama-lhe «mal falar»...) pelo castiço nortenho «vâlho» e «Tâjo» (notai já agora que o étimo latino aqui é Tagus — está justificado o «a»).
Pois bem, por desfastio larguei-lhe lá uma rabecada que vai levar tempo a publicar. E por certo não na há o destinatário de entender. Mas aqui o benévolo leitor entende-me.
« Ódio latente antibrasileiro? Não desvie a questão. Porque haverão os portugueses em Portugal de sujeitar-se a uma grafia brasileira quando o Brasil firmou de livre vontade o Acordo de 45 e não honrou a palavra? Ainda agora, depois desta despropositada e desqualificada reforma [de 90], o Vocabulário da Academia Brasileira ignora imperialmente os neografismos absurdamente portugueses como "receção", "deceção", &c. [v. «Busca, Malaka! Busca!»]
Pior do que chamar ódio latente antibrasileiro ao sentimento pátrio legítimo dos portugueses (ou não podem já os portugueses pugnar pelo que é seu sem serem enxovalhados como racistas?), pior que isso, dizia, é o comprovado desprezo da Academia Brasileira pelo português legítimo (*) dos portugueses; tão legítimo como o português de qualquer outro. Foi isso que Angola tão bem entendeu e por tal se não sujeitou a ditame tão abrasileirado na forma como no motivo.
O Brasil roeu a corda ao acordo de 45 e desafio quem quere que seja a mostrar-me uma palavra de ódio antibrasileiro dos portugueses quando se isso deu em 1955. Os brasileiros sim, faltando à palavra, destilaram ódio aos colonizadores portugueses (**) esquecendo-se (ou não no sabendo entender) que os colonizadores do Brasil são aqueles mesmos que lhe regeram e regem o destino. Tratantes falhos de entendimento e sem palavra que intentam agora despudoradamente colonizar Portugal, Angola, &c.
Em suma, vergar a cerviz em 1990 a quem não teve palavra em 45 e negociar o que já fora negociado rastejar como se nada fosse é duma humilhação inqualificável. Proclamar um presidente de Portugal em 2008 o ratificar da humilhação em terra brasileira, e dizê-lo assim — e dizê-lo assim! — que foi por pressão de algo ou alguém (***), isto então é já qualquer coisa que nem sei dizer o nome! — Mas talvez venham daí os acorditas novíssimos do Restelo esclarecer-me que este presidente de ópera bufa nutre um ódio antiportuguês latente, a verdadeira base da imposição do A.O. de 1990 em Portugal.»
(O. Braga. Série d' «As Vergonhas do Malaca».)
(*) O português dos portugueses é por definição legítimo. Por mais abastardado que se torne. O mesmo se diria do brasileiro dos brasileiros...
(**) «[...] à mistura com o Acordo, segundo consta o anedotário, os distintos Senadores brasileiros consumiram largo tempo a discutir os malefícios da colonização lusitana e o ouro levado do Brasil, no tempo de D. João V [...]». António Viriato, «O Trigo e o Joio, a propósito do Desacordo Ortográfico», in Alma Lusíada, 23/III/2011.
(***) «Quando fui ao Brasil em 2008, face à pressão que então se fazia sentir no Brasil, o Governo português disse-me que podia e devia anunciar a ratificação do acordo, o que fiz.» Cavaco Silva sobre o seu papel na ratificação do Acordo Ortográfico («Cavaco elogia Acordo Ortográfico mas confessa que em casa ainda escreve à moda antiga», Público, 22/V/2012.)
Abarcando á esquerda a Av. Antonio Maria Avellar.
Avenidas Novas em construcção, Lisboa, c. 1900-10.
A.N.T.T, «O Século», Joshua Benoliel, Lote 9,cx. 2, neg. 8.
Há algum tempo topei com esta no Archivo da Torre do Tombo, na collecção d' O Seculo. Ao fundo, á esquerda, topa-se o Campo Pequeno; a deante um palacete. Pelo angulo pareceu-me que o gaioleiro que se constroe podia ser na Av. José Luciano (agora Elias Garcia) ou na Barbosa du Bocage, n'um dos quarteirões occidentaes da Av. Ressano Garcia (agora dicta da República). Succede que o palacete, que é a melhor referência, não se assemelha ao que houve em tempos no n.º 50 da hoje chamada Av. da República antes da construcção do horrendo mamarracho onde há uma B.D.O.; nem pode ser a Avenida José Luciano (ou Elias Garcia) porque o gaveto d'esta com a Av. Ressano Garcia (ou da República) é preenchido por um largo predio de rendimento da auctoria do architecto Ventura Terra, que jaz por lá esventrado (o predio de rendimento, não o architecto) por umas obras que faz que andam mas não andam.
...
Podia ser na Visconde de Valmor (esta não foi chrismada pelos carbonarios não sei porquê) e o palacete ser n'êste caso o n.º 40 da dicta Av. da República, ainda de pé (quanto mais durará) — uma casa adjacente ao Club de Emprezarios. — Mas será...?
Avenidas Novas em construcção, Lisboa, c. 1900-10.
A.N.T.T, «O Século», Joshua Benoliel, Lote 9, cx. 2, neg. 8.
Pouco mais duma dúzia de anos volvidos da demolição do palacete da Av. da República, 77 parece que havia um maior orgulho no edifício novo ali plantado. Tanto que a câmara mandou lá o fotógrafo João Goulart tirar-lhe o retrato. Hoje parece que não é já prédio de apreciar. Pelo menos a julgar das telas de publicidade que sempre o tapam...
Av. da República, 77, Lisboa, 1970.
João H. Goulart, in Arquivo Fotográfico da C.M.L..
All About Eve, Martha's Harbour
(Top Of The Pops, c. 1988)
Praia da Falésia, Algarve, 2011.
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