Cismava se esta era em Lisboa. Pelo porte, e pelo estilo, o palacete dizia-me que sim. Na Avenida da Liberdade? No Campo Grande? -- Parecia-me familiar, o palacete e, todavia, não atinava em lembrar-me.
E aquele arvoredo à ilharga...
Estaria de pé? -- Possível; um palacete de tão bom porte. -- E por outro lado, se falamos de Lisboa, a gosma e o mau gosto lá haviam de fazer das suas...
Afinal é isso! O palácio Sabrosa, à Rotunda. E os campinos diante.
Portugal. Picadors, Lisboa, 1900-1919.
Foto: Charles Chusseau-Flaviens, in George Eastman House.
Lisbonne. Couvent dos Jeronimos de Belem, 1900-1919.
Foto: Charles Chusseau-Flaviens, in George Eastman House.
O artigo da tradutora Paula Blank, ontem no Público, é oportuno. Mais do que a ridícula tradução brasileira, o artigo aflora o problema (sério) da clareza das instruções de manuseio de equipamento hospitalar. A complexidade do equipamento e os riscos de mau manuseio são para os doentes, òbviamente, enormes. A displicência de alguns fabricantes (apesar da lei) para poupar tostões num tradutor nacional roça o criminoso. -- Se é para salvar vidas que fabricam equipamento hospitalar tão complexo, que sentido faz pô-las em risco com a tradução incompreensível de manuais de instruções? -- Eles, os fabricantes, não querem saber de avisos que os façam gastar dinheiro. E bem hão-de poder alijar a culpa, mormente por serem levados na falsa crença de a «unificação» ortográfica tudo resolver, indiferentemente, em termos de tradução para Portugal ou para o Brasil. Vede só até onde o reflexo do desconchavo ortográfico, com a mentirosa propaganda de união do português com linguagem portuguesa brasileira, pode levar o seu efeito nefasto.
O «acordo» ortográfico, não só faz mal à saúde, como põe a vida em risco.
Manual (apesar de tudo sofível) duma máquina de lavar roupa. Serve de ilustração.
(Revisto às seis e vinte da tarde.)
Há dias perguntava-me um estimado correspondente se o verbo «desvanecer» podia ser intransitivo. Não me disse onde o achara.
O Priberam diz que sim. O Aulete, na 1.ª ed. (1800 e carqueja), dá-o como transitivo ou pronominal. Só. E chega. Cheira-me a modernice; essa crioulização dos verbos pronominais que para aí esvoaça em perdigotos de mentecaptos: afastou o papel p[a]ra um lado, também fechando o tinteiro — e enfim desvaneceu. (Francisco Dantas, Cartilha do Silêncio, São Paulo, 1997). Uma das maiores revelações da literatura brasileira, a crer na descrição do produto...
Com esta ainda não topara eu. Fico-lha a dever. Como conspurcação crioula ficamo-la todos a dever a quem bem sabemos.
Diccionario Contemporaneo da Lingua Portugueza [Aulete], Lisboa, Imprensa Nacional, 1881.
Típica paisagem ribatejana em Lisboa. Ninguém me tira da ideia que é esta tirada do viaduto da Av. do Aeroporto sobre a linha de cintura. Até não há muitos anos a paisagem abaixo do Areeiro era assim como o Ribatejo. Com muita terra e o «pouca-terra, passa campo, passa serra...» Alguém que me convença daqueles contornos de casas na neblina da manhã não serem da quinta da Nossa Senhora da Conceição, da quinta das Hortas e lá longe, mais sumida, da do Armador? Lá, na cumeada da Maruja, cujas faldas desciam à Fonte do Louro.
Fotografia: «Comboio de Chelas», Areeiro, c. 1950. A.N.T.T.. Autor não identificado.
Estádio do Benfica no tempo do 2.º anel. Jornalistas desportivos, calhando. E o porteiro, talvez...
Fotografia: «Jornalistas [?]», Estádio do Benfica, [s.d.]. A.N.T.T.. Autor não identificado.
Há tempos topei com um naco de prosa que diz bem o que são os reformadores de ortografias.
« É tão disparatado afirmar que escrever uma palavra com menos letras aproxima a grafia da fonética como afirmar que imaginar um cisne com menos penas torna a nossa imagem mental do cisne mais "próxima" do cisne real.
Uma das motivações da reforma de 1911 era a ideia de que a "ditadura da etimologia" contribuía para o aumento do analfabetismo. Mas sendo assim não se compreende como os utentes do inglês não são maioritariamente analfabetos. Será que afinal não há qualquer correlação entre a ortografia e o analfabetismo? Na verdade, a ideia de "aproximação" à fonética para combater o analfabetismo é apenas um disfarce para o preconceito social. Escrever "filosofia" com "f" em vez de "ph" simplifica a escrita mas isto nada tem a ver com "aproximação" à fonética. A ideia subjacente é que os pobres são muito burros e precisam de uma ortografia muito simplificada, em vez de receberem simplesmente um ensino de qualidade. Dizer que assim ficamos mais "perto" da fonética é uma forma equivocada de dizer que as palavras ficam mais acessíveis ao escrevinhar do povo, tornam-se mais "intuitivas", do mesmo modo que a música pimba é mais "intuitiva" do que a música de Bach. É mais uma vez a defesa da ideia de que mais vale dar um peixe do que ensinar a pescar. Em vez de dar às pessoas os instrumentos para escreverem bem, reforma-se a ortografia.
[...]
Ciente disto, Fernando Pessoa recusou a imposição dos reformadores e continuou a escrever "monarchia", "cysne", "philosophia", "physica", etc. A reacção dos reformadores é tipicamente paternalista: se os "artistas" querem escrever "philosophia", nenhum mal daí vem ao mundo. Os "excêntricos" serão sempre excêntricos. "Com o tempo habituam-se". Aparentemente as reformas destinam-se àqueles que os reformadores consideram que estão abaixo de si, daí sentirem-se tão naturalmente no direito de impor-nos as suas ideias ortográficas.»
Vítor Guerreiro, «Ortografia, fonética e grafia», in Crítica [revista de filosofia], 20/V/2009 [sublinhado meu].
Esta categoria de gente paternalista, que se cuida por sobranceira razão ungida dos deuses para cuidar da felicidade alheia, gira na espiral da sua estupidez, inconsciente. Evangeliza nos corredores da política, missiona nos gabinetes do eduquês, catequiza nos microfones da rádio e TV. Uma raça pegada de estúpidos de serviço e idiotas úteis, toda uma civilização brota destes calhaus, uma nova idade da pedra, em que os amanhãs cantam já hoje.
*
* *
Tenho para mim que a estupidez em se pondo a girar é um moto-contínuo. Na sua voragem dá connosco, azémolas ou não, numa raça de asnos. Cuido que em caindo por si na bárbarie mais primeva, esta raça asinina em gestação não há-de senão extinguir-se catastròficamente por cúmulo de vulgar asneirada. A estupidez consome tudo em redor e consumir-se-á por fim até se exaurir -- paradoxal demonstração, esse laborar autofágico da estupidez, da certeza das leis da termodinâmica que dão como impossível, afinal, um moto-contínuo. -- Até chegar a esse fim derradeiro, porém, a razão mais avisada que clame em alerta é irremediàvelmente devorada pela maldita estupidez. Em abono dela anda aí o gramático Bichara, cuja tarouquice me vai infrene derretendo o português: no pasquim mais expressamente acordita não há boa razão que vingue; só a saga da estupidez lá prospera, seguindo no seu devir de tragar jornalistas, leitores e qualquer memória futura que sobejasse de atributo sério ao papel de jornal. Veja-se, pois, se não é?
« Num dos suplementos do Expresso de hoje, o filólogo brasileiro Evanildo Bechara, que desatrema no acordismo, diz que "Fernando Pessoa não aderiu à Reforma de 1945". Não aderiu nem deixou de aderir: morrera dez anos antes. O que Pessoa nunca aceitou em vida foi a reforma ortográfica de 1911. Mas o desatino foi impresso assim mesmo, sem pudor do académico nem emenda do entrevistador.»
Bruno de Oliveira Santos, «Jornalismo de referência», in Jovens do Restelo, 20/X/12.
Fotografias: Duas perspectivas dum desastre diante do manicómio, Av. do Brasil, [s.d.]. A.N.T.T.. Autor não identificado,
No vocabulário ortográfico da Academia Brasileira de Letras (dito da língua portuguesa) há mais de duzentas entradas com o radical elect-. Há termos tão electrónicos como electrônica, tão electrizantes como electrocussão, tão negativos como electrão; há compostos jaculatórios como electrojacto e electrojato (este notoriamnete menos jactante); há compostos culturais como electrocultura -- provavelmente um ambiente social electrolítico onde se geram os electrófagos (?) que a A.B.L. também regista. -- Há electrodiálise, electrotomia, electrodissecação... Electropositivo (mesmo apesar da carga negativa dos electrões), electrodinâmica e electrostática e por aí fora...
Mas o chocante é haver tudo isto e mais a electrogénese na A.B.L., sem lá haver electricidade!
Enquanto se besuntam de impostos — incluído um sobre produtos petrolíferos — os do governo vendem agora aí ao desbarato a ideia duma bombinha de gasolina barata por cada posto gasolineiro. Chamam-lhe «low cost». Nome pomposo com que cuidam encarecer muito mais a ideia.
3 Minutos. Lavagem automatica, Rotunda da Encarnação, [s.d.].
Vasco Gouveia de Figueiredo, in Arquivo Fotográfico da C.M.L..
Hoje à uma havia um homónimo do defenestrado a dizer coisas na telefonia. Um tal Cadilhe ou Cadilho, uma dessas autoridades morais sábias em inúmera coisa.
Sabeis se chegou ele a pagar a sisa daquele andar que comprou?
Rua das Amoreiras, Lisboa, 1898-1908.
Arquivo Fotográfico da C.M.L..
Vinha ouvindo a telefonia do automóvel e deu no noticiário daquele empregado do P.S., o Tozé. Dizia que ficou todo satisfeito duma chachada que o Holanda da França disse e que era estarmos a pagar caros (*) os erros cometidos por outros. Este outros, deve referir-se àqueloutro empregado do P.S., um que meteu sabática e foi estudar para a sua terra (sua, do Holanda da França).
(*) Em rigor, nas notícias escrevem pagar caro (não caros) os erros, que dá no mesmo.
(Empregado Tozé do P.S. com barrete francês no Comunicador.)
Desta agora nem sei se consigo dizer tudo. O benévolo leitor ajudará se souber. Prima a imagem para ver à lupa e cfr. com o que vem de Alvalade à Madre de Deus em vista aérea.
No quadrante inferior esq. a vila Dias a par da linha do Norte. Ao centro, as traseiras da Fábrica das Varandas (Fábrica de Fiação e Tecidos Oriental). Na dir. em baixo ainda se apanha o Grilo. Mais acima, também á direita e bem marcada, serpenteia a Azinhaga da Salgada até desembocar nas quintas das Conchas e das Conchinhas, acima de Chelas, que estiveram dadas à Fábrica da Pólvora. O Convento de Chelas, ele mesmo se vê mais ou menos centrado no quadrante superior direito, logo ali, onde o ramal de concordância de Xabregas entronca na linha de cintura (est. de C.F. de Chelas). Ao longo desse ramal todo (diagonal do quadrante sup. dir. ao inf. esq.) o vale de Chelas, com uma nesga da Rua Gualdim Paes e vislumbre da Estrada de Chelas; no meio delas fábrica das chitas (que houve no tempo da primeira revolução industrial); mais à esquerda, no limite da imagem, a banda oriental do cemitério oriental de Lisboa: o do Alto de São João; entre ele e a Estrada de Chelas, a Calçadinha de Santo António demarcando as quintas de S. João de Baixo e do Lavrado. Até à Picheleira, a Calçada do Carrascal. Até à quinta da Curraleira a Rua do Sol a Chelas. Separando a Picheleira do Alto do Pina a quinta Nova ou do Gago e o Casal Novo, antes de chegar à quinta das Olaias já para lá do bairro da Picheleira.
Na Picheleira, o antigo Casal dos Ladrões [ou Casal da Porciúncula] dantes da edificação do bairro (e poiso de «rebeldes» em Setembro de 1833 a par do Alto de S. João, no tempo das lutas liberais), acham-se bem visíveis os campos de bola do Vitória e do Padre (depois campo dos Telefones); o primeiro em cabeço terraplenado, a quinta do Grilo; o último em planalto resultante de aterro sobre o vale da quinta da Conceição de Baixo (que separava o casal do Pinto da quinta dos Embrechados).
Do convento de Chelas para lá acha-se uma tira de caminho -- a Azinhaga do Armador -- que nos guia o olhar por cima das quintas até ao limite urbanizado de trás da Igreja de S. João de Brito: é o bairro adjacente à Av. de Dom Rodrigo da Cunha. Além dela adivinhamos talvez o Pote de Água ou as fitas pretas das pistas da Portela a raiar o topo sup. direito da imagem. E mais cá, ainda no vazio de cidade do quadrante sup. dir., podemos, se quisermos, adivinhar as quintas da Rosa, de São Pedro, de S. Pedro dos Peixes, do Armador, da N.ª Sr.ª da Conceição, da Penha, do Malapinho, do Malapo (ou Malapados?), Nova da Bela Vista, dos Mouzinhos, da Flamenga, dos Poiais Vermelhos, dos Alfaiates, do Alpoim, das Teresinhas, quiçá da Graça, já não sei...
Vista aérea do B.ª da Madre de Deus a Alvalade, Lisboa, 1955.
Mário de Oliveira. Arquivo Fotográfico da C.M.L..
(Revisto em 14 de Outubro às cinco para as 11h00 da manhã e em 21/XI/18 ao meio-dia e meia.)
Prima o benévolo leitor na imagem para ver à lupa. Daqui lá identifica-se o bairro das Estacas, o bairro de S. João de Deus, o Areeiro -- o novo e o velho --, o Alto do Pina, a Picheleira...
Além da Avenida do Aeroporto, à esq. da linha de cintura, as quintas da N.ª Senhora da Conceição, do Armador, dos Peixinhos, da Maruja, das Conchas, das Conchinhas, da Salgada, o vale de Chelas e o Convento; mais além a da Bela Vista, a do Marquês de Abrantes ou dos Alfinetes; à dir. da linha de cintura, a da Holandesa, do Casal Vistoso ou das Ameias, do Monte do Coxo, das Olaias até ao fio de casas da Calçada da Picheleria -- os montes do Casal Vistoso encobrem a quinta dos Arciprestes na velha Fonte do Louro; os montes do Coxo e das Olaias encobrem a quinta dos Machados [e do Dr. Villaça], cuja casa [desta última] assentava onde é hoje a escola das Olaias e cujo nome estoutro deitou no esquecimento. -- Na orla do Tejo, Marvila com a Escola Afonso Domingues e a Soc. Nacional de Sabões. A querer sair da metade superior dir. da fotografia a mata e o bairro da Madre de Deus. Isto assim de cór.
Vista aérea do B.º de Alvalade à Madre de Deus, Lisboa, 195...
Mário de Oliveira. Arquivo Fotográfico da C.M.L..
Ah! Faltou dizer a quinta mais antiga: a dos Lagares de El-Rei, na clareira à esquerda.(Adenda às 9h30 da noite.)
Sobram-lhe aí umas cavalgaduras pensantes, hem?!
B de... bestas, pois então!, Praça do Império, 2012.
Adenda:
De Bic Laranja a 10 de Outubro de 2012 às 09:52
O ramal nacional 370-1 tem 4,5 km, liga a E.N. 370 à barragem do Maranhão. O marco miriamétrico aos 0 kms foi diligentemente pintalgado de tinta preta, no figurino do novo Plano Rodoviário Nacional, com os dizeres E.N. 370-1 (bem) a par de E.N. 243 (mal). O estar esta última indicação gravada em baixo relevo no marco indicia o seu reaproveitamento para ali, o que nem é necessàriamente mau. Mas, realçar a informação gravada relativa à E.N. 243 quando o marco foi reaproveitado no km 0 da E.N. 370-1, indicia o quê?
Dir-me-á o benévolo leitor.
E.N. 370-1 (km 0), S. António do Alcórrego (prox.), 2012.
Se quisermos aferir a indigência disto tudo basta seguir o dito ramal até à barragem. Nem um só dos marcos ao longo dos 4,5 km foi pintalgado com as tais riscas pretas do figurino do novo Plano Rodoviário Nacional. Uma bênção, confesso, mas, quer-se melhor prova de o fidalgo pintor de marcos não andar ali para se rebaixar a ramais...?
E.N. 370-1 (km 4), Barragem do Maranhão, 2012.
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