Quarenta graus. Não me recorda nunca de apanhar 40° C no Algarve. O mais que me lembra foram 38° em 94. Lembra-me desse ano cá. O calor deu-me alergia num dia de só 34°. (Só!…) Uma borbulhagem no peito. Na farmácia aconselharam-me o Piz Buïn Allergy (já então a coisa dos nomes em amaricano…) E que evitasse o calor. Fez bem. A borbulhage passou. Ficou-me o Piz Buïn das alergias até hoje.
O calor continuou nesse Julho de 94 e na ideia, também me ainda lembra, trazia aquela cantiga dos 40° à sombra. Não chegou a tanto, então.
Radar Kadafi, 40º à Sombra
(R.T.P., 1987)
Julho de 94. Foram dias bem passados, daqueles em que se a vidinha suspende e parece se vive noutra… Outra que me lembra sempre dele e me também ficou até hoje foi do Nescafé. Ao depois de jantar íamos por vício social à gelataria tomar café. Uma daquelas noites, não sei porquê, alguém resolveu que não, mas, e o café?
Havíamos Nescafé, daquelas saquetas.
Pois, que bem me soube aquele café nessa noite ali! Nescafé clássico ritualmente batido na chávena antes de deitar água a ferver. Não tinha eu hábito senão de expresso de máquina e a treta do Nespresso ainda não havia ou, se havia, não se falava. E dum prazer simples, ali no relvado, numa daquelas noites algarvias, ficou-me o hábito e o prazer do Nescafé clássico. Até hoje.
E hoje, finalmente, no Algarve das minhas vilegiaturas, uma caloraça das antigas.
— Um dia, Camillo, vindo do Porto, preveniu o chefe da estação de Villa Nova de que esperava brevemente a visita de um «bacharel» e pediu-lhe que o guiasse para S. Miguel de Seide. Sempre que chegava um comboio, o chefe da estação perguntava: «Vem ahi algum sr. doutor, que deseje ir para Seide?» Ninguem respondia. Até que finalmente appareceu o «bacharel» annunciado: era um burro que Camillo Castello Branco tinha comprado no Porto.Alberto Pimentel, Os Netos de Camillo, Lisboa, Empreza da Historia de Portugal, 1901, p. 27.
« O nosso campino é o cavalleiro mais gentil de toda a Peninsula. Os guardadores hespanhoes são desempenados e elegantes, mas não hombreiam com os nossos, quando trajam a rigor: sapato aberto, de salto raso e prateleira, meia, calção, fivella, cinta, collete muito decotado, jaleca quasi sempre ao hombro, e barrete.
« Os campinos, n'aquelle tempo, eram como uma raça á parte : sem serem nomades tinham o que quer que fosse do arabe: o cavallo, o pampilho, que é a sua lança, e a hospitalidade na poisada!
« As rixas decidiam-se com um pau de cobrir. Eram os primeiros jogadores de todo o paiz. Desde Alhandra até á Ribeira de Santarem, campino que usasse de navalha seria a deshonra de uma familia, de avós a netos. Isso hoje mudou, e está muito adeantado com a civilisação!
« Não ha cavalleiro em praça, por mais destro que seja, que chegue á elegância d'um campino, só, desamparado, virando um toiro, que reponta com todo o poder da sua força folgada, aos circulos, sobraçando o pampilho, e mettendo-lhe o ferro onde convém. É bonito, e é de destemido; mas, como valor, fazem mais. — Andam lavrando com o gado bravo; ha toiro que se nega a pegar á charrua? Pois não é raro o campino bater-lhe o pé e as palmas, atirar-lhe com o barrete, abrir lhe os braços, gritando: — Entra aqui, boi real! — e pegar-lhe desembolado; isto é, jogando a vida presa a um cabello!
« Não ha passe de capote, nem de muleta, em que o espada mais arrojado se arrisque com tamanha intrepidez! »Bulhão Pato, Memórias, tomo I, Lisboa, Academia Real das Sciencias, 1894, p. 155 e ss.
Quadros: Silva Porto, «Condução de cabrestos», 1890. Óleo sôbre tela, 45 x 56 cm, in leilões Invaluable.com; Raphael Bordallo Pinheiro, «Campino», 1875. Óleo sôbre (?), ? x ? cm, in Museu Bordalo Pinheiro, Lisboa.
Com esta mania agora de roçarem os matos, só ouço os grilos lá muito ao longe.
(Ilustração das Obs. Naturalistas.)
Bibliothecazinha de praia, Algarve — (c) 2022
Uma cerveja…? Não dizem se é de litro…
Em 26 de Junho de 1929 o Ministro da Justiça e dos Cultos, dr. Mário de Figueiredo, publicou a Portaria 6 259, a célebre «portaria dos sinos», que esclarecia quanto à autorização prévia das autoridades públicas para a realização de procissões e, mais importante como se viria a vêr, anulava a proïbição do toque dos sinos ao depois do pôr do Sol. Sôbre o toque dos sinos a portaria esclarecia que o mesmo era permitido a qualquer hora, sem necessidade de autorização ou participação às autoridades administrativas valendo para tanto o art.º 2.° do Decreto 3 856, de 22 de Fevereiro de 1918 que dispunha que o «culto público de qualquer religião pode, de harmonia com as leis, exercer-se nos lugares adequados e a qualquer hora, sem dependência de licença da autoridade pública».
Na reünião do Conselho de Ministros de 2 de Julho de 1929 alguns ministros — mòrmente o Ministro da Guerra, Júlio de Morais Sarmento — opuseram-se à «portaria dos sinos» invocando que violava a Lei de Separação do Estado e a Igreja. A «portaria dos sinos» foi anulada nêsse dia 2. O dr. Mário de Figueiredo, desautorizado que foi, apresentou imediatamente a demissão.
No dia 3 de Julho, o dr. Oliveira Salazar, Ministro das Finanças, pediu também a sua exoneração ao Presidente do Ministério (de há tempo diz-se em Portugal «primeiro-ministro», à inglêsa), o coronel Vicente de Freitas.
No dia 4 de Julho de 1929 o sr. Presidente da República, general Carmona, promoveu um Conselho de Ministros. Após a reünião do Conselho fôi distribuída uma nota oficiosa à imprensa:
« Por divergencias de opiniões no seio do gabinete, o presidente do Ministerio aprsentou [sic] a Sua Excelencia o Presidente da Republica a demissão colectiva do mesmo, que foi aceita. O Chefe do Estado iniciou as consultas para a resolução da crise. Os ministros continuarão a gerir as pastas até á sua substituição». (Diario de Lisbôa, 5-7-929.)
Alembrou-me hoje isto, nem sei bem dizer porquê. A rábula do ministro dos aeroportos não tem nada que vêr. Nem o ministro se demitiu nem o govêrno caíu.
Torre sineira da capela real da Ajuda, Lisboa [s.d.].
Horácio Novais, in bibliotheca d' Arte da F.C.G.
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