Numa recente passagem por Mértola ouvi com enfado, no posto de turismo, chamarem «mesquita» à igreja matriz. Já no adro torci o nariz ao texto de descrição do monumento: - «Em 1238, quando Mértola foi integrada no Reino de Portugal [...]»
Integração. Que maneira tão asséptica de dizer Reconquista.
Este despojar-se de si por sujeição ao outro que é agora escola seria melhor aplicado a futebóis para evitar indigestões (« – Inté os comemos, carago!») do que à História de Portugal. E logo em Mértola, onde os trabalhos da arqueologia tanto nos têm dado.
Depois disto que conto ia procurando o que havia sobre Mértola nalguns livros mais antigos, de antes do advento desta «língua de pau» que hoje medra até das pedras e dos caquinhos da arqueologia, e enfim estaquei n' O Tempo e a Alma – um périplo do prof. Hermano Saraiva por Portugal, salvo erro em 1984-85, com o intuito de «pôr as terras a falar».
Vede o que escrevia ele em Mértola naquele tempo:
“ A nota mais curiosa está no nome que agora lhe dão: «mesquita». Não lhe chamam «igreja matriz» – «antiga mesquita» ou qualquer expressão equivalente. É «mesquita» o que se pode ler, por exemplo, nas placas indicativas do percurso turístico. É um deslize que tem uma explicação: a avidez com que em Portugal se procuram vestígios de arquitectura árabe, que não existiam. São numerosos na Andaluzia, mas inexistentes em Portugal. Pode haver várias razões para isso, e uma delas é a violência da guerra religiosa. Tudo quanto aqui recordava a fé dos vencidos foi implacavelmente destruído. As mesquitas de Mértola (devia ser mais que uma, porque a cidade era capital dum pequeno reino) não fizeram excepção.”
José Hermano Saraiva, Jorge de Barros, O Tempo e a Alma; Itinerário Português, 2º vol., Círculo de Leitores, [Lisboa], imp. 1986, p. 64.
Vá lá o benévolo leitor ler na tal integração «a violência da guerra religiosa»...
E vá lá o leitor ver uma mesquita com interior gótico de fins do séc. XIII e portal renascentista. Com a fiada de ameias denticuladas e os coruchéus cónicos também ameados, o que eu vejo lá é uma igreja de belo estilo alentejano.
Igreja Matriz de Mértola. © 2010.
(*) De Mértola; da invocação de N.ª S.ª da Assunção ou de Entre-Ambas-as-Águas (Raul Proença, Guia de Portugal, vol. II); ou simplesmente da de Santa Maria conforme indicado no local.
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