À parte alguns topónimos cujo significado se perdeu (**), intriga-me a falta de substrato autóctone pré-romano no nosso falar português. Quinhentos anos de romanização foram tão eficazes em delir o que havia antes nesta terra que mais parecem ter assentado sobre uma tábua rasa. Ora mesmo salvaguardando as diferenças nem os canibais do Brasil foram em tal período tão completamente aculturados; a sua linguagem, a marca mais enraizada da cultura dos povos, persiste. Pois a romanização nas Hespanhas, salvos os Vascões, foi temporã e pràticamente total. Cuido que tal fenómeno se não pudesse ter dado sem voluntarismo dos autóctones. Os ibéricos hão-de ter-se empenhado em romanizar-se; não que fossem vazios culturalmente — não há povos assim — mas porque desprezaram os seus modos em favor dos dos novos senhores, até (e principalmente) no falar, esquecendo quase tudo o que eram.
Bom, esta maneira de se a gente despir do que é para se tornar estrangeira configura algo pior que o vazio cultural: é o vaziozinho da fraqueza mental dos indivíduos que colectivamente e por mor de seus melhores se afirmaram como um povo valoroso, mas que mal guiados prestes se deixam tomar por estrangeiros. A romanização fez-se, pois, assim: com autóctones vaziozinhos intelectualmente, sequiosos a absorver o que primeiro se lhes apresentava. Hoje, nesta terra, ainda é pior.
(*) Reedição revista de Halloween há uma ano. Para o ano e seguintes há mais.
(**) Uma reflexão lateral: Iberus (=> Ebro) é o nome latino do rio que se estendeu à terra por onde corria: Ibéria. Acontece amiúde. -- Cuido que vem de Avieno que o rio Tejo se chamara primitivamente Lysos, ou Lusos. E o Guadiana era o Anas. Vamos lá se com dois nomes de rios ibéricos — Lysos/Lusos et Anas — não formaram os romanos o nome duma província mais longínqua na Ibéria: Lusitânia.
Adamastor (O)
Apartado 53
Bic Cristal
Blog[o] de Cheiros
Carmo e a Trindade (O)
Chove
Cidade Surpreendente (A)
Corta-Fitas(pub)
Delito de Opinião
Dragoscópio
Eléctricos
Espectador Portuguez (O)
Estado Sentido
Eternas Saudades do Futuro
Fadocravo
Firefox contra o Acordo Ortográfico
Fugas do meu tinteiro
H Gasolim Ultramarino
Ilustração Portuguesa
Lisboa
Lisboa Actual
Lisboa de Antigamente (pub)
Lisboa Desaparecida
Menina Marota
Meu Bazar de Ideias
Paixão por Lisboa
Pena e Espada(pub)
Perspectivas(pub)
Planeta dos Macacos (O)
Pombalinho
Porta da Loja
Porto e não só (Do)
Portugal em Postais Antigos(pub)
Retalhos de Bem-Fica
Restos de Colecção
Rio das Maçãs(pub)
Ruas de Lisboa com Alguma História
Ruinarte(pub)
Santa Nostalgia
Terra das Vacas (Na)
Tradicionalista (O)
Ultramar
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.